A poeta moçambicana teria completado 85 anos a 20 de Setembro de 2011.
NEGRA
Gentes estranhas com seus olhos cheios doutros mundos
quiseram cantar teus encantos
para elas só de mistérios profundos,
de delírios e feitiçarias...
Teus encantos profundos de Africa.
Mas não puderam.
Em seus formais e rendilhados cantos,
ausentes de emoção e sinceridade,
quedas-te longínqua, inatingível,
virgem de contactos mais fundos.
E te mascararam de esfinge de ébano, amante sensual,
jarra etrusca, exotismo tropical,
demência, atracção, crueldade,
animalidade, magia...
e não sabemos quantas outras palavras vistosas e vazias.
Em seus formais cantos rendilhados
foste tudo, negra...
menos tu.
E ainda bem.
Ainda bem que nos deixaram a nós,
do mesmo sangue, mesmos nervos, carne, alma,
sofrimento,
a glória única e sentida de te cantar
com emoção verdadeira e radical,
a glória comovida de te cantar, toda amassada,
moldada, vazada nesta sílaba imensa e luminosa: MÃE
Segundo Fernando Pessoa, Álvaro de Campos, nasce em Tavira no dia 15 de Outubro de 1890, tem uma educação vulgar de liceu formando-se, depois, em engenharia mecânica e naval na Escócia.
Numas férias, fez uma viagem ao Oriente, de que resultou o poema "Opiário".
Viveu depois em Lisboa, sem exercer a sua profissão.
Dedicou-se à literatura, intervindo em polémicas literárias e políticas.
O seu "Ultimatum", publicado no Portugal Futurista (1917), é um manifesto contra os literatos e políticos instalados da época. Foi um admirador de Walt Whitman e de Cesário Verde.
Apesar dos pontos de contacto entre ambos, travou com Pessoa ortónimo uma polémica estética aberta.
Evoluiu no sentido de um tédio ou cansaço da vida, progressivos e auto-irónicos. É o protótipo do vanguardismo modernista, é também o cantor da energia bruta e da velocidade, da vertigem agressiva do progresso, de que a "Ode Triunfal" é um dos melhores exemplos:
"Nós estamos num estado comparável apenas à Grécia: a mesma pobreza, a mesma indignidade política, a mesma trapalhada económica, a mesmo baixeza de carácter, a mesma decadência de espírito. Nos livros estrangeiros, nas revistas quando se fala num país caótico e que pela sua decadência progressiva, poderá vir a ser riscado do mapa da Europa, citam-se em paralelo, a Grécia e Portugal."
(in As Farpas, 1872)
“Em Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição. Falta igualmente a aptidão, e o engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois factos que constituem o movimento político das nações.
A ciência de governar é neste país uma habilidade, uma rotina de acaso, diversamente influenciada pela paixão, pela inveja, pela intriga, pela vaidade, pela frivolidade e pelo interesse.
A política é uma arma, em todos os pontos revolta pelas vontades contraditórias; ali dominam as más paixões; ali luta-se pela avidez do ganho ou pelo gozo da vaidade; ali há a postergação dos princípios e o desprezo dos sentimentos; ali há a abdicação de tudo o que o homem tem na alma de nobre, de generoso, de grande, de racional e de justo; em volta daquela arena enxameiam os aventureiros inteligentes, os grandes vaidosos, os especuladores ásperos; há a tristeza e a miséria; dentro há a corrupção, o patrono, o privilégio. A refrega é dura; combate-se, atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se, corrompe-se. Todos os desperdícios, todas as violências, todas as indignidades se entrechocam ali com dor e com raiva.
À escalada sobem todos os homens inteligentes, nervosos, ambiciosos (...) todos querem penetrar na arena, ambiciosos dos espectáculos cortesãos, ávidos de consideração e de dinheiro, insaciáveis dos gozos da vaidade.”
(in Distrito de Évora, 1867)
A "Autopsicografia" talvez seja o poema mais conhecido de Fernando Pessoa. Foi publicado no n.º 36 da Presença, em Novembro de 1932 e tomado como ponto de partida da chamada "teoria do fingimento" do poeta dos heterónimos. O poema "Isto", publicado em 1933 também na Presença, estabelece um diálogo dialéctico com a "Autopsicografia", em reacção contra a ideia falsa que Pessoa considere a poesia ser mentira.
O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda Gira, a entreter a razão, Esse comboio de corda Que se chama o coração.
Pequena selecção de adaptações audiovisuais e musicais:
Ontem morreu o futebolista e médico brasileiro conhecido como o "doutor Sócrates". Foi um dos principais activistas da democracia corinthiana, que reivindicava para os jogadores mais liberdade e mais influência nas decisões administrativas. Em plena ditadura militar, os futebolistas estampavam nas suas camisas frases de cunho político, como "diretas-já", "eu quero votar para presidente".
Na próxima quinta-feira, dia 1 de Dezembro, terá lugar a segunda sessão do ciclo de
debate sobre poesia e práticas textuais contemporâneas "POEMATIZA!",
organizado pelo grupo de investigação GAELT
da Universidade de Vigo (16:00 horas, sala C-8, Faculdade de Filologia da Universidade de Vigo). Contaremos com a
presença da poeta galega Estíbaliz Espinosa, que seleccionou dois textos poéticos da sua autoria que apresentará em relação com o seguinte trecho de Clarice Lispector:
"É tão curioso
ter substituído as tintas por essa coisa estranha que é a palavra. Palavras —
movo-me com cuidado entre elas que podem se tornar ameaçadoras; posso ter a
liberdade de escrever o seguinte: "peregrinos, mercadores e pastores
guiavam suas caravanas
rumo ao Tibet e os caminhos eram difíceis e primitivos". Com esta frase
fiz uma cena
nascer, como num flash fotográfico.
O que diz
este jazz que é improviso? diz braços enovelados em pernas e as chamas
subindo e eu passiva como uma carne que é devorada pelo adunco agudo de uma águia que
interrompe seu vôo cego. Expresso a mim e a ti os meus desejos mais ocultos e
consigo com as palavras uma orgíaca beleza confusa. Estremeço de prazer por entre a
novidade de usar palavras que formam intenso matagal. Luto por conquistar mais profundamente
a minha liberdade de sensações e pensamentos, sem nenhum sentido utilitário:
sou sozinha, eu e minha liberdade. É tamanha a liberdade que pode escandalizar
um primitivo mas sei que não te escandalizas com a plenitude que consigo e que é sem
fronteiras perceptíveis. Esta minha capacidade de viver o que é redondo e amplo —
cerco-me por plantas carnívoras e animais legendários, tudo banhado pela tosca e esquerda
luz de um sexo mítico. Vou adiante de modo intuitivo e sem procurar uma idéia: sou
orgânica. E não me indago sobre os meus motivos. Mergulho na quase dor de uma intensa
alegria — e para me enfeitar nascem entre os meus cabelos folhas e ramagens.
Não sei sobre
o que estou escrevendo: sou obscura para mim mesma. Só tive inicialmente
uma visão lunar e lúcida, e então prendi para mim o instante antes que ele morresse e
que perpetuamente morre. Não é um recado de idéias que te transmito e sim uma
instintiva volúpia daquilo que está escondido na natureza e que adivinho. E esta
é uma festa de
palavras. Escrevo em signos que são mais um gesto que voz. Tudo isso é o que me
habituei a pintar mexendo na natureza íntima das coisas. Mas agora chegou a hora de parar
a pintura para me refazer, refaço-me nestas linhas. Tenho uma voz. Assim como me lanço
no traço de meu desenho, este é um exercício de vida sem planejamento. O mundo não
tem ordem visível e eu só tenho a ordem da respiração. Deixo-me acontecer."
Procedência: http://vimeo.com/mpagdp. Projecto 195. Filmado na Companhia Olga Roriz, Lisboa, 22 de Julho de 2011. Realização de Nélia Marquez Martins e som de Márcia Sousa e Nélia Marquez Martins.
Tarsila do Amaral nasceu em 1886 no município de Capivari, no interior do Estado de São Paulo. Era neta de José Estanislau do Amaral, cognominado “o milionário”, em razão da imensa fortuna que acumulou com as suas fazendas no interior de São Paulo.
Estuda em São Paulo e completa seus estudos em Barcelona, onde pinta seu primeiro quadro aos 16 anos. Casa-se em 1906 com André Teixeira Pinto com quem teve a sua única filha, Dulce. Separa-se dele e começa a estudar, a partir de 1916, escultura e, depois, desenho e pintura em São Paulo. Em 1920 embarca para a Europa, onde expõe, em 1922, um quadro no Salão Oficial dos Artistas Franceses. Nesse mesmo ano regressa ao Brasil e, embora não tenha participado da Semana de Arte Moderna de 1922, faz parte do “grupo dos cinco” modernista, juntamente com Anita Malfatti, Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Menotti del Picchia. Nessa época começa também o seu namoro com o escritor Oswald de Andrade.
Volta à Europa em 1923 e tem contacto com outras/os modernistas (Albert Gleizes, Fernand Léger, Blaise Cendrars, etc.). Em 1926 expõe em Paris com grande sucesso e casa-se com Oswald de Andrade. Em 1928 pinta o “Abaporu” que oferecerá como presente de aniversário a Oswald que, inspirado pelo quadro, cria o Movimento Antropofágico. Começa a fase antropofágica da sua pintura. Em 1929 expõe individualmente pela primeira vez no Brasil. Separa-se de Oswald em 1930.
Em 1933 pinta o quadro “Operários” e dá início à pintura social no Brasil. No ano seguinte participa do I Salão Paulista de Belas Artes. Passa a viver com o escritor Luís Martins por quase vinte anos, de meados dos anos 30 a meados dos anos 50. De 1936 à 1952, trabalha como colunista nos Diários Associados.
Nos anos 50 volta ao tema “Pau Brasil”. Participa em 1951 da I Bienal de São Paulo. Em 1963 tem sala especial na VII Bienal de São Paulo e no ano seguinte participação especial na XXXII Bienal de Veneza. Faleceu em São Paulo em 1973.
A Negra (1923)
Pintado em Paris, enquanto tomava aulas com Fernand Léger. Com os seus elementos cubistas é considerado antecessor da Antropofagia na pintura de Tarsila. “A Negra” evoca, também, a infância numa família de grandes fazendeiros, onde costumava haver mulheres negras, geralmente filhas de escravos, que exerciam de amas-secas, espécies de babás, que cuidavam das crianças.
Abaporu (1928)
O quadro mais importante produzido no Brasil no século XX. Pintado para ser oferecido ao escritor Oswald de Andrade, que se assustou ao vê-lo. Chamou o também escritor Raul Bopp e ambos resolveram que aquela figura estranha representava algo excepcional. Tarsila consultou um dicionário tupi-guarani e baptizaram o quadro como “Abaporu” (o ser humano que come). A partir de aí, Oswald escreveu o "Manifesto Antropófago" que iniciou o Movimento Antropofágico na cultura brasileira contemporânea. Foi o quadro mais caro vendido até hoje no Brasil (comprado por US$ 1.500.000 por Eduardo Costantini).
O Ovo (1928)
A cobra grande, relacionada com a mitologia ameríndia, tem um poder de "deglutição". A partir daí, o ovo passa a simbolizar uma génese de algo novo, tal como o propõe a Antropofagia. Esta tela pertence ao acervo de Gilberto Chateaubriand.
A Lua (1928)
A Lua - Este quadro era o preferido de Oswald de Andrade, com quem estava casada quando pintou a tela. Ele conservou o quadro até à sua morte (mesmo já separado de Tarsila).
Antropofagia (1929)
Com este quadro, Tarsila, realizou uma fusão do "Abaporu" com "A Negra".
Em 1891, há 120 anos, morreu Antero de Quental, uma das figuras marcantes da cultura portuguesa na segunda metade do século XIX.
Nasceu em 1842 em Ponta Delgada e veio para o continente, em 1855, e estudou Direito
em Coimbra, entre 1858 e 1864. Em 1865 publicou as Odes Modernas, envolvendo-se ainda na agitação académica,
particularmente através da organização secreta «Sociedade do Raio», de que era
presidente. Datam também deste período as suas manifestações de entusiasmo face
aos movimentos sociais europeus, bem como a leitura dos grandes teorizadores do
socialismo e dos filósofos da época, nomeadamente Proudhon e Hegel, que muito
influenciaram o seu pensamento.
Igualmente, em 1865, e reagindo a Castilho,
encabeçou a Questão Coimbrã, tão importante na evolução da cultura
portuguesa, publicando "Bom Senso e Bom Gosto", carta a Castilho, que
teve várias edições em Coimbra e Lisboa, e A Dignidade das Letras e as
Literaturas Oficiais, em Lisboa. Aí, defendia já a missão social da poesia
por oposição ao lirismo ultra-romântico. Antero ascendeu, assim, a mentor da Geração de 70.
Durante os anos de 1870-72, fez parte das redacções
dos periódicos A República, com Oliveira Martins, Batalha Reis, Eça de
Queirós e António Enes, e do Pensamento Social, com Oliveira Martins.
Fundou, em 1872, a Associação Fraternidade Operária, representante em Portugal
da I Internacional Operária, e publicou, no Porto, Considerações sobre a
Filosofia da História Literária Portuguesa e Primaveras Românticas.
A este período de combate, que perdurou até cerca de
1875, esteve também ligada a organização das Conferências do Casino
(1871), ciclo da responsabilidade do «Grupo do Cenáculo» (que incluía Eça de
Queirós, Ramalho Ortigão e Batalha Reis, entre outros), que Antero elevara a
centro de reflexão política, social e cultural. Nas conferências, leu um dos
seus textos de análise histórica mais célebres, "Causas da Decadência dos
Povos Peninsulares nos Últimos Três Séculos", que corresponde aos desejos
de transformação do país que animavam a sua geração.
Em 1873, a morte do pai fê-lo regressar aos Açores,
dotando-o de uma herança que lhe garantiu uma vida sem problemas económicos.
Entretanto, atacado por uma doença estranha (identificada por alguns como
psicose maníaco-depressiva), foi obrigado a moderar a sua actividade. Apesar
disso, dirigiu ainda, com Batalha Reis, a Revista Ocidental (1875).
Iniciou-se então um período de profundo pessimismo, deixando-se Antero dominar
por um sentimento de morte e de aniquilação pessoal (e universal), numa espécie
de nirvana budista, como única forma de libertação face ao desespero de uma
vida que via apenas como ilusão e vazio, e que os seus Sonetos Completos
(reunidos em 1886) ilustram. Neste período, que terminou por volta de 1880,
publicou ainda no Dois Mundos (publicação de Paris) uma biografia de
Michelet. No ano seguinte, seguiu para Vila do Conde, assumindo a educação das
filhas, entretanto órfãs, de Germano Meireles, um seu amigo, e vivendo em
relativa calma até ao fim dessa década. Aceitou ainda, em 1890, a presidência
da Liga Patriótica do Norte, um dos movimentos de reacção ao Ultimato inglês.
Aos seus problemas pessoais e à persistência da doença somava-se a desilusão
face ao estado do país. Em 1891, regressou a Ponta Delgada e, nesse mesmo ano,
suicidou-se.
A obra de Antero, que reflecte, quer uma evolução,
quer a coexistência simultânea de várias facetas da sua personalidade e de um
intenso drama interior, é fundamentalmente a de um pensador, de um doutrinário
e conceptualizador. Mesmo o sentimento erótico e amoroso, presente em poemas de
juventude, acaba por se tornar fundamentalmente alegórico, reflectindo anseios
e abstracções, mais do que uma emotividade pessoal do poeta. Poeta da razão, da
revolução, mas também do pessimismo, foi um sonetista exemplar.
Em prosa, onde revela grande poder oratório, levou a
cabo o melhor da sua obra crítica e doutrinária, na análise da filosofia da
história portuguesa (como em "Tendências Gerais da Filosofia na Segunda
Metade do Século XIX", ensaio publicado, em 1890, na Revista de
Portugal, de Eça de Queirós) e na crítica do positivismo então dominante, a
que opunha a necessidade de uma consciência espiritual no mundo. A esta
concepção está ligada a ideia de santidade que sempre o dominou — não no
sentido religioso cristão, mas com expressão no seu espírito combativo, numa
epopeia da humanidade e da revolução, na sua fase combativa, e, em princípio e
fim de vida, num apelomístico interior. Pela sua envergadura intelectual, pela
perfeição da sua técnica do soneto e pelo seu contributo para a história das
ideias, é um dos nomes fundamentais da cultura portuguesa.
Um dos seus poemas mais modernos, e que condensa todo um conjunto de problemas estéticos e filosóficos do século XIX, talvez seja "Noites de primavera no 'boulevard'" de 1867:
Em 1908, o compositor Luís de Freitas Branco dedica-lhe este poema sinfónico ("Depois de uma leitura de Antero de Quental")
Obras de Antero de Quental
Poesia: Sonetos (1861), Beatrice (1863), Fiat
Lux (1863), Odes
Modernas (1865), Primaveras Românticas (1872), Sonetos
(1881), Sonetos Completos (1886), Raios de Extinta Luz, Poesias
Inéditas 1859-1863 (1892), Poesias de Extinta Luz e Outras Poesias
(1948) e Versos (1973).
Ensaio e prosa: Prosas
(3 volumes, 1923, 1926, 1931), Prosas Dispersas (1967), Prosas da
Época de Coimbra (1973) e Cartas (2 vols.) e Filosofia (estas duas últimas publicadas em
1991 numa edição das Obras Completas org. pela Universidade dos Açores).
Um dos poetas maiores de Moçambique. Nasceu em Lourenço Marques (hoje Maputo) em 1922 e faleceu em Joanesburgo em 2003. Foi o poeta da resistência no tempo anterior à Independência, sem ter abdicado do activismo no período ulterior. Muitos dos seus poemas são considerados, hoje, como textos fundadores da nacionalidade moçambicana. Bibliografia, poesia: Chigubo (1964); Karingana ua karingana (1974), Cela 1 (1980), Maria (1988), Babalaze das Hienas (1997); ficção: Hamina e Outros Contos (1997).
Biografia:
Neste vídeo, José Craveirinha declama um dos seus poemas mais célebres, "Grito Negro":
Gonçalves Dias denunciou a escravatura, não só dos índios, como também dos negros, dizendo que a riqueza brasileira consiste nos escravos, pois nada se faz sem o seu sangue.
Em "Meditação" de 1845, G.D. fala da ideia da divisão do trabalho, da distribuição do poder e da instrução para denunciar a supremacia do branco, a escravidão do negro e a marginalidade de índios e mestiços. Misturam-se neste texto a dor trazida pela civilização / perda da liberdade e a afirmação da independência /nacionalidade brasileira. Ao contrário do índio, que costuma aparecer na sua obra como "a extinta raça“ ("Os Timbiras“) e raiz da nação brasileira, o negro fica à margem dessas considerações. G.D. dedica apenas um poema ao negro, titulado "A Escrava“. Aí, o problema social divide o espaço com a temática da saudade e do exílio. Dá voz às lembranças de uma escrava das belezas do Congo e do amor lá deixado. Fala-se apenas do sofrimento do negro, sem considerá-lo entre as raízes nacionais, o que pode ser considerado uma atitude comum ao Romantismo brasileiro.
O bien qu'aucun bien ne peut rendre, O Patrie, ó doux nom que l'exil fait comprendre! Marino Faliero
Oh! doce país de Congo, Doces terras d'além-mar! Oh! dias de sol formoso! Oh! noites d'almo luar!
Desertos de branca areia De vasta, imensa extensão, Onde livre corre a mente, Livre bate o coração!
Onde a leda caravana Rasga o caminho passando, Onde bem longe se escuta As vozes que vão cantando!
Onde longe inda se avista O turbante muçulmano, O Iatagã recurvado, Preso à cinta do Africano!
Onde o sol na areia ardente Se espelha, como no mar; Oh! doces terras de Congo, Doces terras d'além-mar!
Quando a noite sobre a terra Desenrolava o seu véu, Quando sequer uma estrela Não se pintava no céu;
Quando só se ouvia o sopro De mansa brisa fagueira, Eu o aguardava — sentada Debaixo da bananeira.
Um rochedo ao pé se erguia, Dele à base uma corrente Despenhada sobre pedras, Murmurava docemente.
E ele às vezes me dizia: — "Minha Alsgá, não tenhas medo: Vem comigo, vem sentar-te Sobre o cimo do rochedo."
E eu respondia animosa: — "Irei contigo, onde fores!" E tremendo e palpitando Me cingia aos meus amores.
Ele depois me tornava Sobre o rochedo — sorrindo: — "As águas desta corrente Não vês como vão fugindo?
"Tão depressa corre a vida, Minha Alsgá; depois morrer Só nos resta!... — Pois a vida Seja instantes de prazer.
"Os olhos em torno volves Espantados — Ah! também Arfa o teu peito ansiado!... Acaso temes alguém?
"Não receies de ser vista, Tudo agora jaz dormente; Minha voz mesmo se perde No fragor desta corrente.
"Minha Alsgá, por que estremeces? Por que me foges assim? Não te partas, não me fujas, Que a vida me foge a mim!
"Outro beijo acaso temes, Expressão de amor ardente? Quem o ouviu? — o som perdeu-se No fragor desta corrente."
Assim praticando amigos A aurora nos vinha achar! Oh! doces terras de Congo, Doces terras d'além-mar!
———
Do ríspido Senhor a voz irada Rábida soa, Sem o pranto enxugar a triste escrava Pávida voa.
Mas era em mora por cismar na terra, Onde nascera, Onde vivera tão ditosa, e onde Morrer devera!
Sofreu tormentos, porque tinha um peito, Qu'inda sentia; Mísera escrava! no sofrer cruento, "Congo!" dizia.
Na próxima quinta-feira, dia 17 de novembro, vai-se iniciar o ciclo de debate sobre poesia e práticas textuais contemporâneas "POEMATIZA!", organizado pelo grupo de investigação GAELT da Universidade de Vigo. Para esta primeira sessão contamos com a presença do crítico literário e professor da Universidade da Coruña, Luciano Rodríguez, que seleccionou dois textos poéticos que introduzirá brevemente e sobre os quais debatirá, depois, com o público. Este debate terá lugar na sala A4-A da Facultade de Filoloxía e Tradución.
Um dos textos em questão vai ser "Cómo se pinta un dragón" de José Ángel Valente (pode ser visto aqui), enquanto o outro será o poema "Isto" de Fernando Pessoa que, junto com "Autopsicografia", é um dos textos mais emblemáticos da sua teoria do fingimento:
Dizem que finjo ou minto
Tudo o que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Como a imaginação.
Não uso o coração.
Cartaz do ciclo de Gabriel Pérez Durán
Tudo o que sonho ou passo,
O que me falha ou finda,
como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa‚ que‚ linda.
Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!
(in Obra Poética, Rio: Editora Nova Aguilar, 1984: 99)
Em continuação dos exemplos, já disponibilizados em posts anteriores, sobre o indianismo romântico de Gonçalves Dias, sobre o testemunho quinhentista da antropofagia do aventureiro Hans Staden e da sua adaptação na TVBrasil e, também, sobre uma interpretação no contexto mais vasto da tradução cultural (desde o primeiro contacto cultural até ao modernismo), queremos destacar aqui ainda outros materiais interessantes e úteis para o estudo do tema. Para adquirir uma noção rápida da importância do conceito/ideia da antropofagia no Brasil moderno, poderia servir esta leitura parcial do manuscrito do escritor modernista Oswald de Andrade sobre "A reabilitação do primitivo", por Beatriz Azevedo, durante o Encontro Internacional de Antropofagia (EIA!) no ano 2005 em São Paulo. “A Reabilitação do Primitivo” é o título dado pela editora à comunicação escrita por Andrade para o “Encontrodos Intelectuais” de 1954 em Rio de Janeiro, e que foi enviada ao pintor Di Cavalcanti que deveria lê-la (in Estética e Política, Obras Completas, ed. por Maria Eugenia Boaventura, São Paulo: Editora Globo 1991:
Em relação ao ritual antropofágico ameríndio, que deu lugar a uma metáfora cultura que não pára de se desenvolver e diversificar na cultura brasileira desde o romantismo, queríamos destacar, ainda, a conferência de Manuela Carneiro da Cunha durante o Encontro Internacional de Antropofagia, nal qual esta professora de Antropologia na Universidade de Chicago faz um breve e sugestivo resumo dos factos e significados do ritual antropofágico tupi:
Gonçalves Dias é o primeiro poeta brasileiro a falar de uma nova raça, valorizando o seu componente indígena que será, como depois também em José de Alencar, o elemento fundador da nacionalidade.
O poema "I-Juca-Pirama" é um conjunto de 10 cantos que parecem conter um projecto épico. O título significa "o que há de ser morto, e é digno de ser morto". O poema está estruturado através da fala-memória de um velho índio sobre a bravura de um jovem descendente da tribo tupi que caiu prisioneiro dos Timbiras, cuja gesta, cantada no seu canto de morte (IV, 15-38), representa a gesta de toda a tribo. O jovem tupi declara a guerra aos timbiras para se mostrar digno de morrer nas suas mãos e esta valentia é o traço característico das figuras ameríndias em Gonçalves Dias. O texto completo pode ser lido aqui.
Introdução a Gonçalves Dias e a "I-Juca Pirama":
I-Juca-Pirama em cinema de animação (2011):
Curta Metragem de animação baseado no poema homónimo de Gonçalves Dias.
Direcção: Elvis K. e Italo Cajueiro; narração: Ruy Guerra
(I-Juca), Roberto Bontempo
(Cacique Timbira), Murilo Grossi
(Pai do I-Juca); música: João Antônio; sound design: Marcelo Guima; percussão: Pauly di Castro:
Uma frase repetida pelo velho timbira no canto X reforça a ideia da testemunha ocular que ele foi: "Meninos, eu vi!". Esta frase e o título do poema ficaram célebres quando foram aproveitados em 1985 como nome de personagem na telenovela“O Salvador da Pátria”. Nesta novela, Juca Pirama é um locutor de rádio que denunciava as oligarquias e os traficantes locais e acaba assassinado continuando, assim, a apologia da valentia gonçalvina:
Aqui poderão aceder ao texto completo do Frei Luís de Sousa e aqui encontrarão um pequeno dossier sobre Garrett e o seu texto dramático mais conhecido.
A primeira adaptação cinematográfica, realizada por António Lopes Ribeiro, teve estreia em Lisboa a 21 de Setembro de 1950 no cinema S. Jorge. Pode ser vista aqui.
No entanto, a adaptação mais recente é de João Botelho, com o título Quem és Tu? (2001). Botelho antepõe à sua reencenação do texto romântico um longo prólogo explicativo, no qual Maria sonha com um D. Sebastião que lhe revela o contexto histórico da Batalha de Alcácer-Quibir:
Há 30 anos estreou-se em Lisboa Bom Povo Português, um dos mais premiados e referenciados documentários históricos sobre a situação social e política de Portugal entre o 25 de Abril de 1974 e o 25 de Novembro de 1975. O realizador, Rui Simões, descreve que esta longa-metragem representa o período histórico em questão «tal como ela foi sentida pela equipa que, ao longo deste processo, foi ao mesmo tempo espectador, actor, participante, mas que, sobretudo, se encontrava totalmente comprometida com o processo revolucionário em curso (PREC)».
'Os Famosos e os Duendes da Morte', a primeira longa-metragem de Esmir Filho, baseada no romance homónimo de Ismael Caneppele, mostra temas que não estamos habituados a associar com o filme brasileiro: tristeza, depressão, frio, camisolas e gente deprimida, a dançar em bailes de tradição germânica e a ouvir música em inglês. Ler mais aqui.
Um rapaz adolescente, fã de Bob Dylan, tem acesso ao resto do mundo apenas por meio da internet, enquanto vê os dias passarem em uma pequena cidade rural de colonização alemã, no sul do Brasil. Mas uma figura misteriosa o faz mergulhar em lembranças e num mundo além da realidade. O filme já foi premiado em diversos festivais ao redor do mundo.
O primeiro episódio da série da TV Brasil. "Antes do Brasil - Cabo Frio, 1530" encena a fragilidade das relações humanas na nova terra. Acreditando tratar-se de um francês, um grupo de índios Tupinambás captura o alemão Franz Hassen. E como os franceses são considerados inimigos da tribo Tupinambá, o alemão pode ser devorado pelos índios. A única saída para Franz é convencer Pero Dias, um português ganancioso que vive entre os índios, a desfazer a confusão. A disputa por riquezas naturais e pela honra permeia a história de um povo feito de pessoas muito diferentes.
Leitura de um excerto de Iracema por Hertenha Glauce, professora de Teatro da Universidade de Fortaleza (UNIFOR, Ceará, Brasil), que conversa com Amílcar Martins (Universidade Aberta, Lisboa, Portugal):
José de Alencar - "De lá pra cá", programa sobre a figura e a obra do escritor brasileiro, apresentado por Ancelmo Gois e Vera Barroso, na TV BRASIL (http://tvbrasil.org.br/delapraca/):
2.ª parte do programa, na qual se começa a falar de Iracema:
Da série "Mestres da Literatura", produzida pela TV Escola, sobre a vida e obra de José de Alencar:
Adaptação cinematográfica de Iracema, a virgem dos lábios de mel por Carlos Coimbra de 1979:
Iracema - uma transa amazônica é um drama documental de 1976, dirigido por Jorge Bodanzky e Orlando Senna. O filme esteve proibido no país e só foi lançado oficialmente no Brasil em 1981. É a história do impacto nas populações da selva amazônica provocado pela rodovia Transamazônica:
A Literatura Brasileira hoje. Diálogos Galiza-Brasil – IV Encontro Internacional Conexões Itaú Cultural, que terá lugar no Consello da Cultura Galega em Santiago de Compostela, entre os dias 17-19 de outubro de 2011, é o quarto encontro internacional do programa do Itaú Cultural e o segundo realizado fora do País – o primeiro foi na Universidade de Wisconsin-Madison (EUA). No Brasil foram realizados os encontros de pesquisadores, tradutores e escritores brasileiros e estrangeiros em São Paulo (2008) e no Rio de Janeiro, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (2009). Além disso, o Conexões Itaú Cultural já apresentou seu mapeamento internacional da literatura brasileira na instalação da Associação Europeia de Pesquisadores em Brasil (Universidade de Salamanca, Espanha, em 2009), no 10º Congresso Internacional da Brasa (Brazilian Studies Association) (Brasília, em 2010), além de participações no Fórum das Letras 2010 (Ouro Preto-Minas Gerais) ou das edições de 2010 e 2011 na FLIP de Paraty.
Os convidados discutirão sobre as dinâmicas atuais da literatura brasileira e as dificuldades para se inserir nos espaços da crítica e dos mercados internacionais e contrastar essa situação com escritores/as galegos/as homólogos e com críticos
literários, editores, pesquisadores, docentes e tradutores.
A estrutura do encontro será de workshop no Consello da Cultura Galega, iniciando-se na tarde do dia 17 e continuando com sessões de trabalho, entre as 9.30h e as 18h, nos dias 18 e 19.
Para a atividade no Consello da Cultura Galega, o Itaú Cultural convidou escritores/as brasileiros/as com trajetórias amplamente consolidadas e com obras traduzidas em diversos países – Luiz Ruffato, Márcio Souza, Cíntia Moscovich, Marçal Aquino e Marco Lucchesi – e pesquisadores/as internacionais, especialistas brasilianistas – Florencia Garramuño, da Universidade de Santo Andrés, Buenos Aires, Argentina, Leonardo Tonus, da Sorbonne, Paris IV, França, além de Darlene Sadlier, da Universidade de Indiana, EUA. A lista de debatedores se completa com treze escritores, pesquisadores, editores e tradutores de literatura brasileira convidados do Consello da Cultura Galega, da Fundación Cultural Hispano-Brasileña e da Universidade de Santiago de Compostela.
O Programa
A Literatura Brasileira, hoje. Diálogos Galiza-Brasil
IV Encontro Internacional Conexões Itaú Cultural
(Santiago de Compostela, 17 a 19 de outubro de 2011)
Organização: Itaú Cultural e Consello da Cultura Galega
Parceiros: Universidade de Santiago de Compostela (Vicerreitoria de Estudantes, Cultura e Formación Continua; Cátedra UNESCO de Cultura Luso-Brasileira), Embaixada do Brasil e Fundación Cultural Hispano-Brasileña
Curadores : Claudiney Ferreira (Itaú Cultural), Felipe Lindoso (consultor do Itaú Cultural) e Carmen Villarino Pardo (Univ. de Santiago de Compostela)
PROGRAMAÇÃO E CONVIDADOS
17.10
16h30 – Abertura e Apresentação para a imprensa.
17h30 – 19h30 Conexões Itaú Cultural – A literatura brasileira hoje: Conexões, dentro e fora do Brasil.
Com Claudiney Ferreira, Felipe Lindoso, Carlos Quiroga e Marco Lucchesi
Mediação: Carmen Villarino
18.10
9h30 – 11h30 Descobrindo o Brasil – As pesquisas sobre literatura brasileira e suas ligações com outras disciplinas no âmbito do “Brasilianismo”.
Com Carlos Paulo Martínez Pereiro, Elena Losada, Florencia Garramuño e Darlene Sadlier
Mediação: Leonardo Tonus
12h00 – 14h00 Diálogos de escritores 1.
Escritores brasileiros e galegos/as conversam sobre as condições de produção da literatura e a relação de escritores/as com leitores/as nos dois países
Com Marçal Aquino, Luiz Ruffato, Suso de Toro e Iolanda Zúñiga
Mediação: Felipe Lindoso
16h00 – 18h00 A mediação cultural como diálogo
Com Marco Lucchesi, João Almino, Antonio Maura e Manuel Bragado
Mediação: Márcio Souza
18h15
Entrega da coleção de livros de assunto galego-brasileiro do Servizo de Publicacións da Universidade da Corunha e da Universidade de Santiago de Compostela.
19h30
Lançamento do livro O conto brasileiro contemporâneo.
Editado por Laiovento e organizado por Luiz Ruffato e Carmen Villarino Pardo.
Local: Livraria Couceiro de Santiago
19.11
9h30 – 11h30 As vertentes do ensino de literatura brasileira
Com Pedro Serra, Leonardo Tonus, Florencia Garramuño e Darlene Sadlier
Mediação: Carlos Paulo Martinez Pereiro
12h – 14h Espaços para a literatura brasileira atual
Com Marçal Aquino, Cíntia Moscovich, Anxo Quintela e Elias Torres
Mediação: Luiz Ruffato
16h – 18h Diálogos de escritores 2.
Escritores/as brasileiros/as e galegos conversam sobre as condições de produção da literatura e a relação de escritores/as com leitores/as nos dois países
Com Márcio Souza, Cíntia Moscovich, Xavier Queipo e Victor Freixanes
Mediação: Claudiney Ferreira
"Estranha Forma de Vida" traça, ao longo de 26 programas, o percurso da música popular portuguesa desde a década de 30 até à atualidade, com base no Arquivo da RTP e nos testemunhos de cantoras/es, compositoras/es e produtoras/es. De entre as entrevistas exclusivas, contam-se nomes como os de Simone de Oliveira, Madalena Iglésias, José Cid, Sérgio Godinho, Jorge Palma, Pedro Abrunhosa ou Ana Bacalhau. Este primeiro episódio vai dos anos 30 até à atualidade. António Fortuna recorda os cantores da Rádio, a canção de protesto surge pela voz de Fernando Tordo e José Cid dá o seu olhar sobre a censura na música. Os festivais da canção, as novas gerações de fado e as mudanças do rock na década de oitenta com imagens inéditas do arquivo RTP e entrevistas a Tozé Brito, Katia Guerreiro e Zé Pedro. É o primeiro de 26 episódios que passam na RTP 1, quartas-feiras, às 23h45.
Hans Staden, um aventureiro e mercenário alemão no século XVI, publicou em 1557 com a História Verdadeira e Descrição de uma Terra de Selvagens, Nus e Cruéis Comedores de Seres Humanos, Situada no Novo Mundo da América (Wahrhaftig Historia und beschreibung eyner Landtschafft der wilden nacketen grimmigen Menschfresser Leuthen in der Newenwelt America gelegen) um dos primeiros bestsellers sobre o Novo Mundo.
Staden recria neste livro as duas viagens que o levaram em 1548 e 1549 ao Brasil, onde, na segunda viagem, foi feito prisioneiro por uma tribo tupinambá no litoral fluminense, que era, na altura, antropófaga. De facto, o livro representa o primeiro testemunho pormenorizado de antropofagia ameríndia e o relato junto com as ilustrações ajudaram a criar, no imaginário europeu quinhentista, a ideia do Brasil como terra de caníbais.
Através de comentários pios, Staden apresenta-se como uma espécie de Daniel na cova do leão, maltratado por selvagens e salvo devido à fé e às preces em voz alta. O seu valor etnográfico, porém, só se começou a apreciar a partir do século XX.
O seguinte filme de 1999, dirigido por Luiz Alberto Pereira e inspirado no livro de Staden, é um dos poucos na história do cinema em que a língua falada é, de forma predominante, o tupi-guarani:
O editor e tradutor José Bento Renato Monteiro Lobato adaptou o livro de Staden em 1927 para o público infantil e juvenil com o título As aventuras de Hans Staden. Em 2009, a Editora Globo, lançou uma versão em banda desenhada de Denise Ortega e Stil e com ilustrações de Arcon.
Partes do documentário de 2000, co-produzido pela TV Cultura, a GNT e a Fundar. Contou com a participação de Chico Buarque, Tom Zé, Antônio Cândido, Aziz Ab´Saber, Paulo Vanzolini, Gilberto Gil, Hermano Vianna, entre outras personalidades. O Povo Brasileiro é uma recriação da obra homónima de Darcy Ribeiro, e discute a formação dos brasileiros, sua origem mestiça e a singularidade do sincretismo cultural que dela resultou.
Darcy Ribeiro descreve no livro que: "[...] Todos nós, brasileiros, somos carne da carne daqueles pretos e índios supliciados. Todos nós brasileiros somos, por igual, a mão possessa que os supliciou. A doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se conjugaram para fazer de nós a gente sentida e sofrida e sofrida que somos e a gente insensível e brutal, que também somos. Como descendentes de escravos e de senhores de escravos seremos sempre servos da malignidade destilada e instilada em nós, tanto pelo sentimento da dor intencionalmente produzida para doer mais, quanto pelo exercício da brutalidade sobre homens, sobre mulheres, sobre crianças convertidas em pasto de nossa fúria." "A mais terrível de nossas heranças é esta de levar sempre conosco a cicatriz de torturador impressa na alma e pronta a explodir na brutalidade racista e classista." (1995, p.120)
Produção da RTP sobre Os Lusíadas de Luís de Camões para série "Grandes Livros":
Documentário que defende Camões ser o mais importante representante da cultura portuguesa, realizado por Hélder Macedo para o programa "Grandes Portugueses" que se emitiu na RTP em 2007:
Dentro de um ciclo de literatura brasileira na Biblioteca da Cidade de Viena (Hauptbücherei Wien), em colaboração com IX Congresso de Lusitanistas “Descobrimentos e utopias: A diversidade dos países de fala portuguesa” (14-17/IX/2011), João Ubaldo Ribeiro, um dos maiores exponentes da literatura brasileira contemporânea e membro da Academia Brasileira de Letras, leu, na sexta-feira passada, uma série de textos do seu livro Um Brasileiro em Berlim de 1993. A apresentação foi realizada pelas professoras Ute Hermanns e Kathrin Sartingen.
O seguinte vídeo reproduz a leitura da crónica "Vida organizada", originalmente publicada no diário alemão Frankfurter Rundschau (20/X/1990), durante a residência do escritor em Berlim, um ano depois da queda do muro. Embora a qualidade do vídeo seja péssima, é possível acompanhar a leitura aumentando o volume ao máximo:
Aqui reproduzimos um excerto do texto:
[...] Por exemplo, um alemão que saiba português responderá sem hesitação que a palavra portuguesa "amanhã" quer dizer "morgen". Mas coitado do alemão que vá para o Brasil acreditando que, quando um brasileiro diz "amanhã", está realmente querendo dizer "morgen". Raramente está. "Amanhã" é uma palavra riquíssima [...] [...] "Amanhã" significa entre outras coisas, "nunca", "talvez", "vou pensar", "vou desaparecer", "procure outro", "não quero", "no próximo ano", "assim que eu precisar", "um dia desses", "vamos mudar de assunto" etc. e, em excepcionalíssimos, "amanhã" mesmo. [...]
Capítulo "Vida Organizada" - Página 53 à 52 do livro "Um brasileiro em Berlim" de João Ubaldo Ribeiro
O LABORATÓRIO DE IMAGEM E SOM da Universidade Federal Fluminense iniciou o projecto OS LUSÍADAS A TODO VOLUME, no qual se apresenta uma gravação e sonorização da epopeia camoniana em 10 arquivos sonoros. Especialistas em Literatura Portuguesa realizarão leituras integrais do texto camoniano, que passará por tratamento sonoro, edição e sonoplastia. Para o Canto I, o convidado foi LUÍS MAFFEI, professor de Literatura Portuguesa da UFF e poeta.
Um vídeo cheio de meias verdades, embora tenha um final surpreendentemente crítico, apresenta-se como a resposta às reticiências finlandesas de prestar ajuda financeira a Portugal:
"Louvor do lixo" (in A Mulher-a-Dias, Lisboa: &etc 2002, 13-14):
para a Amra Alirejsovic
quem não viu Sevilha não viu maravilha)
É preciso desentropiar / a casa / todos os dias / para adiar o Kaos / a poetisa é a mulher-a-dias / arruma o poema / como arruma a casa / que o terramoto ameaça / a entropia de cada dia / nos dai hoje / o pó e o amor / como o poema / são feitos / no dia a dia / o pão come-se / ou deita-se fora / embrulhado / (uma pomba / pode visitar o lixo) / o poema desentropia / o pó deposita-se no poema / o poema cantava o amor / graças ao amor / e ao poema / o puzzle que eu era / resolveu-se / mas é preciso agradecer o pó / o pó que torna o livro / ilegível como o tigre / o amor não se gasta / os livros sim / a mesa cai / à passagem do cão / e o puzzle fica por fazer / no chão
"Nunca choraremos bastante..." (in Decote da Dama de Espadas (Romances), Lisboa: Gota de Água 1988):
Nunca choraremos bastante / termos querido ser belas / à viva força / eu quis ser bela / e julguei que para ser bela / bastava usar canudos / pedi para me fazerem canudos / com um ferro de frisar e papelotes / puxaram-me muito pelos cabelos / eu gritei / disseram-me para ser bela / é preciso sofrer / depois o cabelo queimou-se / não voltou a crescer / tive de passar a andar com uma peruca / para ser bela é preciso sofrer / mas sofrer não nos faz forçosamente belas / um sofrimento não implica como consequência / uma recompensa / uma dor de dentes pode comover a nossa mãe / que para nos consolar sem saber de quê / nos dá um rebuçado / mas o rebuçado ainda nos faz doer mais os dentes / a consequência de um sofrimento / pode ser outro sofrimento / a causa é posterior ao efeito / o motivo do sofrimento é uma das consequências / do sofrimento / os papelotes são uma consequência da peruca
O cheiro de Deus - Recital de poesia de Adília Lopes
Adília Lopes - Nota 4
A Elisabeth foi-se embora, Adília Lopes
A Elisabeth foi-se embora
(com algumas coisas de Anne Sexton)
Eu que já fui do pequeno-almoço à loucura
eu que já adoeci a estudar morse
e a beber café com leite
não posso passar sem a Elisabeth
porque é que a despediu senhora doutora?
que mal me fazia a Elisabeth?
eu só gosto que seja a Elisabeth
a lavar-me a cabeça
não suporto que a senhora doutora me toque na cabeça